Esteve na família durante dezassete anos, deixei-a em Portugal, ao cuidado da minha mãe, em 2004. Anteontem recebi por telefone a notícia que a Bonnie já não está mais connosco. A idade e as maleitas retiraram-lhe quase toda a qualidade de vida que tinha e o veterinário já nada mais podia fazer para lhe dar uns meses da mesma, quando muito apenas cuidados paliativos para lhe prolongar o sofrimento e as dores que um cancro lhe infligiam. No passado dia 10 morreu serenamente e vai deixar-nos muitas saudades.
A Bonnie a desfrutar o sol português numa das nossas belas praias. |
Trouxe-a para casa dos meus pais em 1995 a pedido de uma ex-namorada amiga dos animais e também porque não suportei a ideia de ver um bicho tão pequeno abandonado à sua sorte, a abrigar-se da fria chuva minhota debaixo de um Renault 9. Estávamos em São Martinho do Vale, em Vila Nova de Famalicão. A primeira vez que vi a Bonnie foi a partir da janela do meu Fiat 128 SL; adorei de imediato aquela cabecinha pequena com um focinho curto, olhos grandes e "nariz de botão" como dizia o meu pai.
Baptizada de Bonnie Maria no mesmo dia foi prontamente limpa de parasitas e lavada. O meu pai que gostava de animais mas não os queria em casa - não gostava da ideia de um dia os ver morrer - foi peremptório - Não quero esse cão aqui em casa! A Bonnie abanando a sua cauda vigorosamente e indo atrás dele todo o tempo conquistou-o em poucas horas. Ficou connosco até 2013 naquela casa onde já não vive o Ricardo, onde a namorada deixou de o ser e vivendo mais dez anos do que o meu pai, poupando-o do desgosto que ele tanto receava.
A minha mãe é a verdadeira heroína desta longa história da cadela Bonnie. O bicho apesar de ser novo quando adoptado já vinha com problemas na coluna vertebral fruto de alguma agressão ou atropelamento sofrido, ficou com as patas traseiras praticamente paralisadas em 1999 e o ajudante do veterinário da Câmara Municipal (esse matador) prontamente se ofereceu para abater o cão, tudo dito a riso, ao típico estilo com o típico desdém que o matador tem por os bichos. Viramos-lhe as costas para sempre e com muita paciência e carinho foi-se fazendo terapia, primeiro deixá-la caminhar dentro de água na banheira e depois pondo um pano por baixo da barriguinha de modo a que pudesse fazer as suas necessidade e ao mesmo tempo caminhar. Alheios aos risos e comentários de alguns vizinhos mais embrutecidos fomos determinados e a Bonnie recuperou a locomoção para grande espanto dos veterinários.
Depois os anos passaram; o namoro com a miúda que nos trouxe a Bonnie acabou, fui para a Polónia em Erasmus e regressei a Portugal. A Bonnie sempre feliz por me ver, mais tarde aceitando de bom grado a então namorada polaca que, nesse tempo, tinha pavor de cães. Foi uma terapia para ela e desde então perdeu todo o medo aos amigos caninos, de tal modo que até adoptamos uma cadela na Polónia.
Os anos passaram e as maleitas sucederam-se. Problemas de rins que acabaram numa caríssima operação de 1000€ e dieta especial, hérnias na coluna vertebral, um atropelamento sem grande consequências excepto o óleo de motor que lhe sujou o pelo e lhe pregou um grande susto por ficar debaixo do carro, um gato que a cegou de uma vista e por fim a idade que a alquebrou. Nunca a minha mãe desistiu, levando-o para todo o lado (excepto para a Polónia por motivos óbvios). A Bonnie ia frequentemente para Lisboa com a minha mãe e também para o Algarve. Andou na praia e nas quentes areias da nossa costa, de carro e de comboio.
Não pude estar ao lado dela nos seus últimos momentos, a emigração tem destas coisas e aprendemos a viver com a distância medida em horas de voo ou quilómetros de auto-estrada. Construimos, consciente ou inconscientemente, um muro que nos protege das saudades. Esta é a minha singela homenagem à cadelinha Bonnie. Minha "cãozinha" (como te chamava tantas vezes) - vou ter saudades do teu pelo, desses dentinhos de fora, da tua pequena língua e mesmo desse terrível hálito a cachorro. Sorrio sempre que te imagino a rosnar junto à porta da varanda pronta para ir ladrar aos cães que passam ou quando te pegavas com a arqui-rival Pantufa ali para os lados do Restaurante-Café Benfica.
À minha mãe o mais sincero agradecimento por tudo o que fez pela Bonnie. Não é de ficar orgulhoso em ter uma mãe assim?
Pequenina grande Bonnie, tão linda, saudades...foste uma lutadora e sortuda no dia que cruzas-te na minha vida e tiveste uma família que te acolheu tão bem...lamento pela vossa perda. Fátima
ResponderEliminarObrigado Fátima, pelo carinhoso comentário e por teres tido um gesto tão bonito em querer proteger um animal que acabou por fazer parte da família quase vinte anos! Bem hajas e olha, diz qualquer coisa quando queiras. Ricardo.
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